Fim de temporada

Se a nossa vida fosse como um seriado, onde cada ano é uma temporada, poderia dizer que 2012  foi a mais fraca delas. Os últimos episódios servem de resumo. Na verdade, foi um ano em que não fui protagonista da minha própria história. Felizmente esta temporada está chegando ao fim.

O melhor que posso levar dela são lições para a próxima. Que minha personagem seja mais egoísta e menos ingênua. Que tenha aprendido de uma vez por todas que a maioria das pessoas querem algo em troca de tudo ou mesmo sem dar nada. Que não se relacione com quem não te pergunta as coisas, mas prefere saber de ti pelos outros ou te abandone sem motivos.

Quero acumular novamente as funções de roteirista e diretor, cortar o núcleo nocivo e manter o agregador. Quero novas locações, novas cenas de ação e romance. Tudo o que não teve na apagada atual temporada.

Em 2012 perdi o rumo, dinheiro, tempo e dignidade. Virei um mendigo de atenção. Em 2013 não quero esmolas, também não quero ir às forras. Quero e terei aquilo que for para mim de forma justa. A dor da última humilhação acabou se tornando o melhor motivador para levantar e ir à luta, buscar as garantias, renovar o contrato com a produtora. Essa temporada foi pior que o especial de natal do Star Wars. Vamos ver se pelo menos a Season Finale dá o tom de mudança para melhor.

A desejada habilidade de ser idiota

Esse ano se apresentaram para mim todos os amores que tive na vida. Todos! Da segunda série do ensino fundamental ao ano passado. Vinte anos de amores, todos juntos, todos jogando na minha cara as minhas incapacidades, minha sorte, meu gosto raro. E, em meio a tantos fantasmas, eis que me apaixono de novo, diferente, mais forte. Um amor que tentei evitar a todo custo. E que me rendi com poucas horas de uma conversa. Eu evitei esse amor não nela, mas em todas as pessoas que deixei pelo caminho, pelas quais poderia me apaixonar facilmente. Mas era ela. A mudança da minha vida, do meu destino. Eu não pensei assim, ela se apresentou assim. Ela é assim.

Eu podia ter dado certo com muita gente, podia mesmo. De fato, dei com algumas delas por tempo o bastante para acharem que não funcionaria mais e, ao mesmo tempo, suficiente para me dizerem, agora, que estavam erradas. Não me orgulho de causar isso em algumas pessoas, arrependimento. Poderia ser reconfortante alguém dizer “eu não soube dar valor ao que tinha”, se a perda não tivesse sido tão grande. Eu não quero mais pessoas arrependidas por isso. Agora mesmo, prefiro que se arrependam por eu ter sido um idiota, do que por ter sido “bom”. Deve ser por isso que existe tanta gente canalha. Um arrependimento justo não machuca.

Quem nunca se sentiu aliviado por não ser o único em uma situação desesperadora? Pode ser não ter estudado para uma prova, deixado de entregar um trabalho, ter chegado atrasado ou esquecido um documento essencial, exame de direção ou de sangue mesmo. Você fica nervoso pela sua patetice, mas relaxa quando vê que não é o único lascado. Acho que é isso que acontece na maioria dos relacionamentos. Procura-se alguém para subjugar. Para não ser solitário na mediocridade.

Conheci um casal na sua solteirice. Ele não era lá muito bonito, mas tinha um corpo muito bem trabalhado, resultado de anos de dedicação. Ela parava o trânsito, não havia onde passar despercebida. Se casaram informalmente e ele foi proibido de continuar na academia. Lembro dele me contando isso com a certeza de que o embargo demoraria algumas semanas. Anos se passaram e as vezes vejo o belo casal de gordinhos ainda juntos, veja que maravilha! Será esse o segredo da felicidade?

Eu duvido muito. Aliás, tenho certeza que não. Comum é o desabafo de desquitados, principalmente mulheres, “quanto tempo perdi na minha vida”. Certamente ouviria isso do casal amigo se eles não estivessem mais juntos. Ser feliz não é ter alguém para ser igualmente inapto, como você.

Uma relação saudável não deve ter controle, respeito sim. Confiar que não te trairá sem que seja necessário fiscalizar o celular, e-mails e redes sociais. É o que sempre fiz, respeitar e dar espaço. A insegurança vem de brinde, não devia. Espero, sinceramente, que meu último amor não se arrependa. Espero que se algum dia aconteça, não me diga. Que saiba que isso fere mais do que contenta, pelo menos para pessoas não tão vaidosas.

Imagem retirada de http://lia1031.wordpress.com/2006/08/04/the-idiots-guide-for-looking-stupidfor-dummies/

Aparentando ser um idiota para leigos

Como ser ruim o suficiente para não ser abandonado é a grande equação a se descobrir. Tal como toda habilidade, alguns já nascem, outros adquirem e outros tem dificuldades para aprender. Me incluo nessa última lista. Se tivesse uma faculdade para isso, eu faria da graduação ao PhD. Pois parece que a única chance de ser feliz nessa vida é não se importar com quem você deveria, ou melhor, querer não ter uma pessoa com quem se importar.

Perfeição

Perfeito é uma palavra latina e significa “feito por completo, sem faltar nada”. Mas eu adoro brincar com a cognação e sempre digo que perfeito é aquilo que é “feito para”. Gosto mais da minha interpretação, afinal o que é perfeição para uns é irrelevante para outros.

Irrelevante, algo que algumas pessoas conseguem ser para quase todo mundo, menos para você que a ajudou a entender o que essa e outras palavras significam. Olhamos para o espaço e nos sentimos poeira. Mas aquela partícula de gente consegue fazer com que você perca um pouco dos 70% de água que tem no corpo. Ainda assim, eu acho perfeita.

Como quando pega o jornal para ler de manhã. Eu não sei se está lendo notícias relevantes, fofoca dos artistas, horóscopo ou o resumo das novelas. Não importa, o interessante aqui para mim é a concentração, o torcer dos lábios que eu apenas posso fechar os olhos para ver. Eu pediria a página das cruzadinhas e tirinhas e assim compartilharíamos idealmente o periódico.

Vivemos no limiar da modernidade, não nos atrevemos a aceitar tudo o que se impõe sem querer ter um pouquinho de século XIX, as vezes com a inocência e malícia desse. Sabe fazer do monótono divertido. Não mede o tempo. É egoísta, mas merece ser. Somos quadrados como nossas mães, espelhos da nossa personalidade. E não pára por aí.

Errantes como quem não tem compromisso com a culpa, meio malucos, meio bobos sem motivos, meio tristes sem motivos e um monte de motivos para sermos tudo o que nos negamos a ser. Mostramos querer mais do que realmente precisamos para ser felizes, talvez na esperança de que o destino nos ouça e nos premie com uma sorte mais bonita.

Sintonizados ao ponto de trocar mensagens ao mesmo tempo às 6:08 da manhã sem combinar, sonhar com as mesmas coisas, ouvir as mesmas músicas, xingar as mesmas pessoas. Chateados, nos calamos. Não fugimos de uma boa briga, mas evitamos entrar nela. Mas nem tudo é perfeito, no sentido original.

Porque também somos muito diferentes. Amo café, ela odeia. Ama pamonha, eu não ligo. Mas acho lindo ela contar as moedinhas para comprar a felicidade efêmera feita de milho. Quer ser vista, quero ser invisível. Quer tumulto, quero paz. Quer dinheiro, eu também, em proporções diferentes de importância. Valorizamos os amigos, mas eu não me importo com os problemas triviais deles. Sua resposta para os problemas sérios é que “vai passar”.

Tão iguais e tão diferentes que as vezes eu tenho dúvida sobre com quem estou falando. As vezes odeio a igual e amo a diferente, as vezes é ao contrário. E eu só tenho certeza de que ela foi feita para mim e continua se perfazendo itera-e-incrementalmente. As semelhanças e distâncias parecem formar de nós a silhueta caprichosa de duas peças de quebra-cabeças. Ela é tão perfeita que se encaixa certinho no meu estranho gosto de me apaixonar por quem não está nem aí para mim.

Ateísmo “crente”

The fundamental cause of trouble in the world today is that the stupid are cocksure while the intelligent are full of doubt” (A principal causa dos problemas no mundo na atualidade é que os estúpidos tem muita certeza, enquanto os inteligentes estão cheios de dúvidas).

A citação é do livro de 1929, O casamento e a moral, de Bertrand Russel, no capítulo sobre a Ética Cristã. É difícil, para livres pensadores, não associar esta frase aos, fanáticos ou não, religiosos. Volta e meia, nos deparamos com uma discussão tola em que nossa falta de resposta parece dar a vitória a quem está certo do que acredita.

O ateísmo ou a ausência de religião parece estar crescendo no mundo todo, inclusive no Brasil. Mas aqui esse crescimento tem características únicas. O tema aparece constantemente nas redes sociais e provoca discussões apaixonadas e, normalmente, ilógicas. Mais parece uma briga de torcedores de futebol.

É inevitável creditar essa tendência à pobreza da educação no país, que claramente não ajuda a desenvolver o senso crítico. Além disso, as igrejas-negócio tem um papel fundamental. Elas escancaram o esquema e qualquer um com um mínimo de inteligência sabe que estas não tem o propósito da fé. Esta visão acaba sendo estendida à todas as religiões pelo novo descrente.

Via de regra, as pessoas são religiosas por herança cultural. Ser ateu, até bem pouco tempo, era fruto de um logo exercício de autoconhecimento, normalmente. Não existem escolas ateístas – não confundir com ensino laico – e não é muito comum ateus tentando converter religiosos. Isto vem mudando com a Internet.

Seja pelo enfraquecimento da tradição religiosa de outrora, ou por algum trauma com igrejas, as pessoas, geralmente jovens e adolescentes, estão tendo contato com a informação ateísta e a estão assimilando, de maneira simples e sem muitos questionamentos. Dessa forma, o ateísmo tem ganhado força de oposição às religiões, principalmente ao cristianismo.

Costumo chamar esse fenômeno de “ateísmo crente”, porque tem os mesmos mecanismos dos religiosos em geral, baseado exclusivamente na sua “fé” de que nenhum deus existe, acreditando cegamente nisto e tentando convencer ao próximo de que este é o único caminho que deve ser seguido.

Para o ateu clássico, este movimento não é agradável. Embora seja bom ver menos cidadãos seguindo religiões e deixando de patrocinar um dos principais meios de manipular massas, as igrejas, eles não estão livres de outros enganos e meios de alienação – política, por exemplo. Assim, o “ser ateu” não lhes está agregando muito valor. Em contrapartida, a imagem dos ateístas pensadores ficam mesclada à imagem do “ateísmo crente” ou, como muita gente prefere dizer, “ateísmo modinha”.

Existem crentes cheios de dúvidas, provavelmente a maioria dos ateus e outros que nunca chegarão ao ceticismo, mas que não aceitam a imposição de verdades por líderes religiosos. Da mesma forma, começa a existir um sem número de pessoas que se autodenominam ateístas ou agnósticas e reproduzem todo o tipo de “verdade”, desde que a mesma fira alguma religião ou autoafirme sua não necessidade dela. Apesar de encontrarmos muita gente em fase de desenvolvimento de sua consciência nos redutos ateístas populares da Internet, é nítido que a grande maioria está bastante longe de poder ser considerada “livre pensadora”. Portanto, a frase de Russell, comumente associada à cristãos, muito provavelmente continuaria pertinente num estado de maioria ateu. E os problemas do mundo continuarão por muitas atualidades.

R.I.P.

Quando pensei nesse nome para a página, imediatamente busquei os domínios .com e .com.br. O primeiro não estava disponível e este daqui, obviamente, sim. Agora, meses depois de adquirir o endereço, procurando ver como ele está sendo indexado, acabei descobrindo que aqui descansa em paz um blog.

Me fez recordar os tempos de criança, quando promovia verdadeiras escavações no quintal em busca de evidências de alguma história. Arqueologia não é algo que me interessa como carreira, definitivamente, mas sempre fui fascinado por saber como as coisas eram antes.

O último vestígio deixado pelo antecessor deste é o índice no Archive.orghttp://web.archive.org/web/20100129070605/http://nem8nem80.com.br/

Infelizmente, o tema não ficou guardado. Entrarei em contato com o antigo dono para ver se ele tem alguma fotodetela.

Além disso, descobri que o autor do antigo blog tem um novo: http://sensonerdcritico.wordpress.com/

Incluí uma ícone ()do fim da página como referência a esta publicação, é uma forma simples de querer dizer que devemos olhar pra frente sem esquecer do que nos trouxe até aqui.

Falha de autenticidade no Facebook

Poucas pessoas perceberam que existe ou usam o serviço de e-mail do Facebook. A ideia de centralizar contatos, mensageiro e e-mail em um mesmo lugar me agradou bastante e eu resolvi que as mensagens enviadas pelo formulário desta página me chegassem diretamente na caixa de entrada do meu perfil social. Foi quando percebi esta falha, que permite qualquer pessoa passar-se por outra muito facilmente, mascarando o remetente.

Embora o spoofing de e-mail, como é conhecida essa técnica, seja um problema para qualquer serviço de correio eletrônico, no Facebook, ele é agravado por associar o remetente ao perfil cadastrado na rede social. Como o serviço é muito básico, sequer possui opção para exibir o cabeçalho do e-mail, o que, para a grande maioria dos usuários, nem faria muita diferença.

Formulário usado para facilitar o teste

Para reproduzir o problema, criei um formulário simples em HTML/PHP usando a função mail(). Utilizando o e-mail de cadastro de alguns amigos, pude me enviar mensagens ao meu perfil como se fossem eles. Neste teste, todas as 8 mensagens chegaram, sendo 4 como SPAM. Entretanto, há técnicas mais avançadas para “spoofar“.

Também fiz um teste utilizando os endereços @facebook.com dos usuários. Neste caso, com previa, nenhuma das mensagens chegaram.

Falsa mensagem chegando na caixa de entrada.

Em tempos onde as redes sociais se tornaram um dos principais meios de comunicação e os maus entendidos imperam, uma mensagem plantada, como a que fiz minha amiga “me enviar” poderia ser trágico para um relacionamento.

Talvez por isso, o Facebook tenha deixado de exibir, por padrão, o e-mail principal dos contatos.

Se não conhecia e quer saber um pouco mais deste recurso do Facebook, visite https://www.facebook.com/help/212136965485956/

Não há como desativar este e-mail, o que se pode fazer é restringir a que apenas amigos possam te enviar mensagens, nas configurações de privacidade. Essa prática, entretanto, não evita que a falha de autenticidade seja aplicada com o seu perfil. Nos resta esperar para ver como o Facebook vai lidar com esse e tantos outros problemas que trazem um serviço de correio eletrônico.

Sobre esta coisa

Bem vindo à minha página pessoal! É, é bem isso que essa coisa é. Era pra ser uma outra. Era pra ter um texto bonitinho neste lugar. Mas se fosse assim nunca sairia da ideia. Por isso mesmo, resolvi descartar o maravilhoso texto que vinha bolando havia bastante tempo.

Passa que descobri ser um procrastinador crônico. Tal psicose só permite ao burrinho aqui fazer as coisas se estiver sob a motivação da cenoura ou a pressão do chicote. O alaranjado legume que me deixou colocar esse blog no ar foi, justamente, minhas ganas de combater esse problema. Então, antes que qualquer coisa, esta é a minha terapia. Devo falar mais sobre isso logo, ou deixarei para o próximo dia.

Não será um blog puramente temático, mas tentarei escrever com alguma frequência sobre atualidades, buscando um ponto de vista opositivo à opinião generalizada. Além disso, pretendo publicar criações literárias pessoais e de amigos, projetos e o que mais me der na telha.

Publicações recorrentes serão sobre tecnologia, cultura pop, fotografia, tutoriais, crônicas do cotidiano e umas colheradas de política, mitologia, fórmula 1 e queijo. Ou não! Minha ideia é usar esse espaço para treinar minha escrita e, por isso mesmo, vai ter muito texto ruim e resolvi não divulgar mais o blog, mais que algum link no meu Facebook. Quem chegar aqui por qualquer lado que seja e quiser deixar um feedback será muito bem vindo!*

Obrigado pela visita!

* Editado em 18/06/2013

Fidelidade: uma missão quase impossível

Texto originalmente escrito para o extinto site ateistas.com sob o pseudônimo Francisco (Paco) Rafael González

Enquanto as pessoas, em sua maioria, ao serem perguntadas, dirão que nunca foram infiéis, de fato, a maioria delas, já foram de alguma maneira. Assim como existe muitos tipos de gente, existem também várias formas de ser infiel e, quase sempre, é inevitável sê-lo. O que considero mais importante, no entanto, é a forma como alguém desfará seus vínculos de fidelidade.

Ora, o senso comum aponta a infidelidade simplesmente como o ato libertino com alguém fora do relacionamento. Quando se estabelece a relação, sobretudo amorosa, normalmente, a fidelização é um conceito implícito e, raramente, acordos podem ser feitos no sentido da não exclusividade. Estes acordos, que parecem absurdos para algumas pessoas, podem ser a única chave da verdadeira fidelidade. Não obstante, ser fiel é honrar todos os compromissos estabelecidos no acordo de relacionamento e não é necessário que haja adultério para que este acordo seja fraudado.

Cada pessoa reage de forma diferente ao comportamento de outras e a seu próprio. Algumas possuem um tipo de esperteza para enganar sua consciência. É o que ocorre quando um indivíduo, estando dentro de um acordo de relação, se interessa por outra pessoa e, inevitavelmente, vai realizar esta troca. Mas, geralmente, a fará de maneira a sentir-se digno. Vejamos o caso de Maria e João, um casal feliz, até aparecer José. Utilizarei o elemento feminino por considerar as mulheres muito mais engenhosas e criativas no não cumprimento do acordo de fidelidade.

Maria tem um interesse por José e ela descobre ser verdadeira a recíproca. A reciprocidade não é fundamental, mas ocorre na maioria dos casos. Infelizmente, ela está num acordo com João, prometeu jamais abandoná-lo entre outras promessas que costumam fazer os apaixonados. Maria vai ficar com José, de uma forma ou de outra, e ela vai escolher a que lhe faça sentir melhor. Ela poderia, simplesmente, trocar João por José, se desculpar pelo fim do acordo e ser feliz. Mas muitos dilemas morais, opinião das pessoas de fora ou mesmo de João e José, fazem com que este processo de troca seja complexado.

Maria pode terminar sua relação com João, sem alegar que existe outro alguém. Ela poderá usar a desculpa que melhor lhe convier, estas, não faltam em qualquer relacionamento. Uma vez rompido o contrato amoroso, o caso com José poderá começar imediatamente, às escondidas ou não, ou ela ainda se permitirá um tempo. Qualquer que seja o caso, dependerá do seu bem estar, da preocupação com a sua imagem diante das outras pessoas e, quiçá, de si mesma. Mas ela pode não ser tão corajosa para terminar, ou mesmo, não acreditar ser suficiente para salvar sua reputação. Então, ao invés de colocar-lhe fim, ela mina o relacionamento, muda sua forma de ser, sem oferecer explicações, forçando João a romper o contrato. Desta forma, ela estará menos complicada ao aparecer tão cedo com outra pessoa, afinal, para todos os efeitos, João foi quem não foi tolerante e fiel e é mais compreensível, a olhos alheios, a reposição de sua carência.

Existem ainda diversas técnicas que se utiliza, conscientemente ou não, para mascarar a infidelidade. Não estamos tratando do clássico caso de adultério, pois esta configuração não precisa e nem merece ser explicada. Também, não cabe comparação caso a caso. Vivemos em um mundo onde a competição se revela em qualquer seara. Quando tratamos de pessoas queridas, devemos tentar suprimir qualquer tipo de disputa, mas este é tema para outro artigo. O que muitos não imaginam, todavia, são os possíveis danos causados na parte preterida, devido ao sentimento de traição ou mesmo de total ignorância.

A grande questão é: a infidelidade pode ser evitada? E a resposta é muito individual. Ela pode sim, ser evitada, mas com algum custo, talvez da felicidade do sujeito. Quando não se está disposto a pagar este preço, há formas e formas de fazê-lo, e isso vai depender de cada um. A que eu considero mais digna é a honestidade total. No começo da relação podem deixar claro que é algo que poderia acontecer algum dia. Mesmo que isto não fique explícito, o mais correto seria ser totalmente verdadeiro. Maria dizer a João que o deixará porque deseja compartilhar com José do sentimento de interesse. Esta atitude também tem seu preço, mas seja qual for o resultado, este será um resultado real e justo. No fim das contas, o saldo mostrará a força do seu caráter.

Lembre-se que o costume faz hábito e acostumar-se a mentir para se sentir melhor poderá torná-lo uma máquina de engenharia social. Talvez para pequenas intempéries do dia a dia seja um artifício útil, mas não quando se deseja relacionamentos reais e duradeiros com pessoas que são importantes.

Un beso ateísta.

Paco González

Ateu: uma palavra que lembro como aprendi

Quando se tem 12 anos não se dispõe de muita vontade própria, normalmente. E lá estava eu com minha mãe, acompanhando-a em mais uma das costumeiras e fastidiosas, para mim, visitas às suas amigas. A descrição do lugar pode parecer encantadora: uma fazenda no meio do nada, frutas maduras nos pés, uma cachoeira convidativa instalada no rio que cortava o quintal da casa. Mas eu já estava muito habituado com aquilo e a única coisa na propriedade que me prendeu a atenção por alguns minutos foi observar o funcionamento do moinho de milho tracionado pela água desviada de seu curso natural através de um sistema de canaletas.

De volta à cozinha, onde acontecem as conversas de comadre, sentando num cantinho, buscava qualquer coisa que me tirasse dali momentaneamente. Li tudo o que era possível, revistas de fofocas, receitas, calendários, bulas de remédio, até decidir perambular pela casa grande e pouco mobiliada. Minha curiosidade permitiu-me encontrar, atirado embaixo do sofá, um livro de poesias de Drummond de Andrade. Não lembro qual era a obra que me fez postergar o ataque aos bolinhos de chuva que estavam saindo do óleo a perfumar até a sala. O autor não era totalmente desconhecido para mim, tinha lido inúmeras vezes a crônica No Restaurante, incluída em certa coletânea. A lembrança me fez verter a atenção que tinha nos versos para a orelha do livro. A curta biografia trazia duas novidades que não esqueci: sua morte no dia do me aniversário e a palavra “ateu”.

Soaria estranho eu não conhecer tal verbete a esta idade, não fosse o fato de eu morar, havia anos, em um lugarejo com dezesseis casas, três igrejas, uma escola e um botequim, apenas. Sem televisão, bibliotecas ou bancas de revistas, minha fonte de conhecimentos era limitada aos livros infantis e adolescentes que minha mãe, única professora do local, guardava em casa para que não fossem saqueados durante os períodos em que a escola era emprestada, pela municipalidade, à uma quarta denominação cristã que não tinha sede fixa. Ser religioso não apenas era obrigatório, mas prático, afinal, os cultos aos domingos era uma das poucas formas de entretenimento fora da rotina diária.

Fui, então, indagar minha mãe sobre a palavrinha estranha a meus ouvidos e olhos. Ela me responde secamente “é não acreditar em Deus”. O incomodo que uma simples palavra pode causar nas pessoas é incrível. Nossa anfitriã reagiu mais energicamente, mas se acalmou ao ter a formidável ideia de usar, futuramente, aquelas páginas como combustível para o fogão à lenha que, nesse momento, cozia nosso jantar. Para minha surpresa, não me tomaram o profano objeto e voltei à poltrona tentar continuar a leitura. Não consegui me concentrar imediatamente. Não me cabia que aquele arquiteto de poesias tão belas estivesse queimando no inferno.

Minha falta de fé já vinha me assombrando fazia tempos. Naquele instante, senti medo novamente. Queria ter algo daquele talento, sem perder minha alma. Não terminei de ler o livro, a ordem era clara “Venha jantar, para irmos embora depois”. Poderia tê-lo salvo de seu cruel destino, mas não o fiz. Provavelmente, o intento me traria mais dilemas morais, de acordo com a educação que tinha naquela época. Embora não tenha me tornado o escritor habilidoso que desejei, sinto orgulho de compartilhar com Drummond uma de suas melhores qualidades: ser ateu.

Um problema da sociedade brasileira: o mentirismo – Segunda carta de Paco aos ateístas

Texto originalmente escrito para o extinto site ateistas.com sob o pseudônimo Francisco Rafael González

Caros colegas ateístas do sítio ateístas.com, nesta postagem, quero falar sobre um tema que vejo enraizado na cultura brasileira, esta que eu admiro tanto, a comunhão da mentira. Venho de um país, meu querido México, onde as bromas são cotidianas e, em certos aspectos, identificáveis com a forma de ser do brasileiro. Tenho uma breve vivência nos Estados Unidos, onde o sacarmo é bastante apreciado, mas normalmente acompanhado de bons tragos de franqueza. Não me surpreendeu ver que aqui, dada a gentileza natural de sua gente, o mentirismo piedoso fosse tão comum. O que, sim, me deixa algo perplexo é como a insinceridade não apenas é desejada, como muitas vezes, solicitada.

O Brasil é uma ubicação ingrata para os adeptos ao verdadeirismo. Embora a maioria das pessoas, se questionadas sobre preferir verdade a mentira, digam, sem pensar, a primeira, elas gostam mais de ouvir inverdades, ou seja, elas já estão mentindo, até mesmo nesta resposta. E porque esta hipocrisia? Porque a verdade é mais bem vista por seus pares e parecer apreciá-la agrega valor moral.

Um fato é que as pessoas adoram mentir e adoram ouvir mentiras, ou verdades que já conheçam e lhes são agradáveis. Quando alguém, com um fenótipo claramente esbelto, diz que se sente feio, muito provavelmente está mentindo para que digam a verdade que lhe convém. Se realmente estivesse incomodado com sua aparência, dificilmente tocaria no tema e, se o fizesse, ficaria feliz com uma provável mentira simpática. Em último caso, que uma pessoa franca confirmasse seu aspecto detestável, possivelmente a reação seria de magoamento, explícito ou não, ou no máximo de conformismo inconforme.

As crianças são altamente treinadas para se corromperem desde que começam a falar. Não fossem suficientes as não clarezas das respostas dos pais, professores e demais adultos cercanos, às dúvidas mais comuns dos pequenos, seja por constrangimento, ignorância ou preguiça, também ralham-lhes pelas supostas ofensas proferidas. Uma verdade é diferente de um insulto. Dizer que uma pessoa é peluda e pançuda é diferente de dizer que parece um chimpanzé. Te parece horrível dizer algo assim para alguém, ainda que seja de forma ingênua? Então, foste treinado. As pessoas só se incomodam com a verdade porque também foram orientadas que isto é errado. O ideal é que aprendam a ser respeitosos, não engenhosos. Com a idade aprenderão as consequências de suas palavras, mas se forem instruídos a mentir, o farão para a vida toda.

A começar pela escola, onde farão parecer que fizeram as pesquisas e os mestres farão parecer que as leram. O educandário divide com a família a responsabilidade de formar adultos emocionalmente dependentes.

Adultos, estes, que viverão falsos relacionamentos. Uma parte das mulheres, senão a maioria, quando interrogadas acerca do que espera de um companheiro, omite o que realmente lhes faz interessar à primeira vista, para dizer que sinceridade é essencial. Incautos, não se deixem enganar! Nenhuma mulher é sincera quando afirma que o que mais lhe agrada em um homem é a sinceridade. Absolutamente, para dizer-lhes se estão gordas ou ridículas, um espelho ou uma amiga atenta é o suficiente. Da parelha, espera apenas doces falsetas e verdades óbvias.

Em outra via, os homens mentem para satisfazer esta necessidade das mulheres. Alguns fingem querer algo mais sério, para ter o que os dois querem. Mentem aonde vão, o que fazem, com quem falaram, independente de serem infiéis ou não, mas porque não querem iniciar uma discussão filosófica sobre o nada de mais ou o tudo de muito menos. É o protocolo do amor. Olhos que não veem, coração que não sente.

Homens e mulheres que, no trabalho, serão igualmente dissimulados. Geralmente, os mais habilidosos chegam a altos postos e tratam de enganar os clientes, para melhores resultados financeiros. É um círculo vicioso que se repete nos esportes, política, meios de comunicação. Quanto mais mentirístico, maior repercussão terá.

Embora seja este um fenômeno mundial, a falácia, no Brasil é arraigada ao coloquialismo cotidiano. Contestar à um simples pedido de opinião com uma lhana resposta pode abalar fatalmente uma relação, de qualquer espécie. Isto porque as ligações são construídas em bases ilusórias, sustentadas por uma delgada camada de vaidade, proveniente, possivelmente, das clássicas desigualdades sociais seculares.

As gerações atuais já estão perdidas. Infelizmente, é quase impossível, ou porque não, catastrófico, que cidadãos começassem a dizer o que pensam cruamente. Mas o mundo será um lugar melhor, concertezamente, se deixarmos nossos filhos crescerem sem o mentirismo como arma de defesa e ataque. Pessoas superprotegidas são fracas, poucas conseguem usar isso a seu favor e se fortalecer. Ateístas do Brasil, uni-vos em prol da construção de um país de pessoas fortes e livres!